sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Sexta-feira é pra você

Quero acordar bem cedo
Pra que o dia dure mais
Quero ver-te a meu lado
Com a cara linda de sexta-feira
E dizer palavras doces
Em clima de feriado.

Quero saber o início
E a hora de parar
Pra que nada seja excesso
Nada sobre, nada falte
E em tudo que preencha
Ainda exista a falta
Que necessite saciedade.

Quero tua companhia
Em botecos e bebidas fortes
Falar alto e rir à toa
Ouvir palavrões românticos
Pasmem: isso é possível
Ser filho da puta
E ainda sorrir aos montes.

                                                                          Rafael Freitas

domingo, 18 de setembro de 2011

Dionísio

Não quero dizer mais nada
Quero ouvir, eu tenho ouvidos.
Não quero encenar um texto
Quero assistir, pois tenho olhos.
Não vou compor música nova
Não tenho acordes em minhas mãos.
Não vou provar sua bebida
Quero sua língua em meu domínio.
Não vou mostrar minha aspereza
Eu me permito, eu tenho tato.
Não vou mais perder meu tempo
O tempo todo tenho relógios.
Vou aceitar minha nudez
As minhas roupas não são meu corpo.
Vou penetrar em seus sentidos
Meus sentimentos sem dimensão.
Eu me permito mais um cigarro
Mais um prosecco, mais um tropeço.

Hoje eu só pago pra ver
Eu simplesmente sou platéia.

Vivas a Dionísio
Em sua casa, meu coração.

                                                                      Rafael Freitas

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Amanhã

Se for pra morrer que seja agora
Enquanto minha história produzirá saudades e não vergonha
Em meu filho e nas pessoas que amo.

Se for pra enriquecer que seja hoje
Enquanto em meu país os políticos tem um preço
E as pessoas sem valor também.

Se for pra entristecer que seja nesse momento
Em que a felicidade não tem um valor real pra mim
E o que é real não me contenta
E o que me contenta não me seduz.

Se for pra ser sozinho que seja agora ou daqui a pouco
Enquanto minha presença ainda não é sentida
Enquanto sua presença não é por mim sentida
Enquanto nossos sentidos não nos acusam.

Se for pra me calar que assim seja
Enquanto minha garganta esconde o que o peito sente
Enquanto o grito ecoa só em pensamento
E o silêncio é algo ensurdecedor.

Se for pra me arrepender que seja da poesia
Que agora escrevo sem um amanhã
E o amanhã vai me provar sem erros
Que meu engano é pura falta de encontro.

De me encontrar em algo
De me encontrar em mim.

                                                                                Rafael Freitas


quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Segunda Carta

Seus olhinhos fitavam cada movimento daquele bico enorme e colorido.
            “Olha o tucano pai!”
            Eu ali parado com a cabeça gritando vida nova. Coisa estranha essa. Você já é independente. Escolhe o sabor do sorvete, a pizzaria e o quarto onde quer dormir.
            Certamente eu sou mais indeciso e confuso.
            “Eu quero o leão!”
            “Eu quero algodão doce!”
            “Eu não preciso tomar água!”
            Nossa, como você sabe das coisas!
            Mas não se discute filosofia com crianças. Sou seu pai e pronto.
            Sua mãe e eu não estamos mais juntos como casal, mas estaremos sempre unidos como pais.
            Você é minha alegria diária e minhas saudades também.
            Seja livre. Diferente das araras e tucanos e leões e atendentes de fast food.
            Meu coração dói ao pensar na sua independência. Mas meu corpo dói pelo trabalho, minha cabeça pelas cervejas, meus pés pelos meus tênis baratos e tudo isso passa.
            Eu vou estar sempre aqui. Ou ali.
            Mas vou estar.

                                                                                                 Rafael Freitas


quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Único

        As cores ainda ofuscavam a visão quando pisou o primeiro degrau da porta de saída. Esfregou os olhos como se pudesse limpá-los da claridade excessiva. Era como se um mundo novo nascesse.
À sua frente um carro esperava com os faróis e motor ligados.
Ela estava ao volante, com um sorriso claro como a manhã que despontava no horizonte.
Ele também sorriu sem esperar nada em troca.
Os últimos bêbados da noite já haviam partido.
Ele não bebeu nem cheirou, não fez nada. Queria a sobriedade para aquele momento.
A vida pode ser tão simples que até assusta às vezes.
O amor assusta quem nunca amou.
O momento era único.
Decidiu partir.
Deixou o riso derreter em sua face.
Ela continuava ao volante.
Ele foi embora sozinho.
       
                                                                         Rafael Freitas