De tanto
sonhar acordado, seus olhos ressecaram.
Ardiam e
apresentavam a vermelhidão tóxica das noites mal dormidas e dos
amores acabados.
Sentia dor
mas não se movia.
Não sabia
se o sonho tinha terminado ou se os finais felizes sempre carregam
consigo a dor.
Já não
enxergava o que tanto olhou, não distinguia cores e tons e luz.
Somente a
seca.
Como o
leito dos rios sem chuva que racham com o sol de dezembro.
Como a
pele exposta ao frio das manhãs de um árido outono.
Nenhuma
lágrima.
Não
conseguia chorar em meio ao sonho sem sono diário.
Já não
lembrava o que o fez sonhar, mas sabia que era bom.
Melhor que
o despertar vazio das manhãs de segunda-feira.
Melhor que
o descansar das madrugadas alucinógenas dos feriados.
Sentia o
cheiro das flores que não sabia se existiam de fato.
Depois de
um bom tempo a dor já não incomodava.
Como a
toalha molhada sobre a cama após anos de casamento.
Como o
mastigar à mostra do sobrinho obrigatório.
Conseguiu
com muito esforço movimentar os dedos das mãos e dos pés.
Levantou-se
vagarosamente e sentiu a brisa em seus cabelos.
O sonho
tinha sido realidade por alguns segundos.
Agora tudo
estava acabado.
As
lágrimas vieram com força, como se rompessem o pâncreas, o fígado,
os pulmões, até estourarem na face em prantos convulsivos.
Realmente
era o fim.
A seca
acabou.
Rafael Freitas
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