quinta-feira, 23 de maio de 2013

Quarta carta

             Mochilinha nas costas, uniforme sem manga e a perna rabiscada de caneta.
            Pára na porta, me dá um abraço apertado e segue sozinho seu caminho pelo corredor da escola.
            Eu fico ali parado, coração aos pulos, cheio de orgulho e de vontade de assistir sua entrada na sala.
            Você já vai sozinho onde quer. Está cada vez mais independente, cheio de vida e curiosidade.
            Frases bem elaboradas, impressionantes pensamentos, brinquedos meio exóticos. O punk de cabelo verde é um limpador de vaso sanitário e a saboneteira de plástico um barco, uma nave.
            Como você me faz feliz!
            Eu ando meio cansado. Dor nas costas e nas pernas, cabeça cheia de indecisões, coração aflito nem sei por que.
            Fico preocupado em pensar que posso estar ausente de sua vida. Fico angustiado com a mínima possibilidade de não ganhar um sorriso seu.
            Sinto saudades sempre. Toda hora. Cada segundo.
            A liberdade de pensar e agir é sua. Você nasceu assim, livre. Tem o espírito dos aventureiros e alma de poeta.
            Descobri como o tempo passa ao enfeitar sua silhueta de papel. Você cresceu. Está crescendo.
            O futuro, às vezes, me dá medo. Não quero ver você indo embora, sozinho, mochila nas costas.
            Não quero assistir sua vida sem fazer parte da trama.
            Não quero mais chorar por hoje.
            A vida nos prega peças. O mundo nos ensina a valorizar quem amamos a duras penas.
            Não consigo definir o que sinto quando ouço sua voz, quando sinto seu cheiro, quando me chama de papai. É indefinível, indescritível, indecifrável. Ainda não inventaram títulos para todo esse sentimento que explode em meu coração, minha alma.
            Espero estar sempre pronto. Se não estiver, improviso.
            O mundo não pára. Despedidas e reencontros sempre haverão.
            Você sempre vai morar em meus pensamentos.
            Sigamos de mãos dadas, meu filho, minha paz.
            Hey! Ho! Let’s go!

                                                                                        Rafael Freitas


quinta-feira, 16 de maio de 2013

O que acaba no domingo


A solidão fria dos trens lotados
O pensamento amargo
Nas gulags municipais
O susto cego das noites frias
E a certeza de ser feliz
Três noites por semana
Doze dias por mês, poucas horas
Para uma vida inteira
Que acaba no domingo.

Não quero mais ser este
Este só, somente
Quero soma, adição
Nem calor, nem frio
Olhos vidrados na escuridão
Memórias vagas
Que não lembram rostos
Só sentem cheiros
Lembram sorrisos.

Não quero mais ser este
Este só, semente
Vida nova brota e flore
Por mais que os olhos chorem
São nascentes para os sonhos
Quer acabam às despedidas.

                                                Rafael Freitas