quinta-feira, 31 de julho de 2025

Borboleta

Era hora do almoço.

Um dia frio, desde o começo

Naquela hora, um sol que ardia.

Era hora do almoço

Eu pensava, sem um porquê

Em flores brancas, talvez a paz (?)

Naquela hora, tudo confuso:

Carros, sol, asfalto, almoço

Branca, uma borboleta pousou no trânsito.

Cravou-se ao chão, asas ao vento

Branca, como um lírio da paz (?)

Seu pequeno corpo tremia

Tudo parecia ser mais forte

Mas ela se mantinha em pé.

A paz (?) exige firmeza

Destreza, certeza, pureza

Ou tudo o que eu não posso ter.

 

Rafael Freitas

 


segunda-feira, 12 de maio de 2025

Sobre perdas

Era uma manhã nublada, dessas de boca seca e vontade de sumir.

Quando o telefone toca num sábado bem cedo nunca é boa notícia.

As roupas balançavam no varal sem nenhum barulho. O mundo estava em silêncio com a notícia sobre você.

Talvez não fosse sobre você.

Pode ser que tenha sido mais sobre mim que sobre você.

Na verdade, nem um, nem outro.

Era sobre a fragilidade humana, a brevidade da vida e todas as questões sobre sentido.

Era sobre o agora, a ansiedade e a espera por um futuro que nunca chega.

Era sobre o que se sabe sobre tudo.

Nada.

Eu não sei nada. Nunca entenderei a profundidade de um gesto tão cruel e poético em si mesmo.

A possível busca do amor eterno de Shakespeare, em seu Romeu e Julieta.

A pílula vermelha da Matrix.

Só posso dizer do silêncio que se criou na insensata gritaria dos meus pensamentos.

Hamelin perdeu seu herói.

A orquestra perdeu o solista.

Eu perdi um irmão.

 

Rafael Freitas

terça-feira, 11 de março de 2025

Sobre café com açúcar

Fico olhando para o nada.

Apenas nada.

Todo o nada.

O nada que existe e teima em resistir.

Aquele hiato no tempo que nos faz perder a hora, que nos faz perder o senso, sentir o silêncio.

O silêncio que até parece o nada, mas é tudo o que nos resta.

“Bom dia!” – corredor, gritos, caminhos infinitos que não levam a lugar algum.

“Bom dia!” – resposta mecânica, sem ensaio nem expressão.

E assim se vai a vida.

Nesses vindouros quarenta anos nessa existência, nesse lugar, com essas pessoas.

Quarenta anos passados (vividos?), vindos de tantos outros passados, tempos paralelos.

Sinto a mesma solidão dos dez, dos vinte, dos trinta anos.

O que a difere de outrora, enquanto escrevo, é a sua necessidade.

Sinto a necessidade, quase que vital, quase que urgente, da solidão.

A solidão silenciosa que a princípio incomoda, assusta a própria sombra, desenterra o passado.

Essa solidão, melancólica e rude, em pouco tempo se transforma em festa, companhia de carnaval.

Uma vida solitária. A experiência empírica de ser um só no mundo e, ao mesmo tempo, muitos.

Já não fumo há alguns anos. Bebo quase nada. Não dispenso café com açúcar.

Liberto sorrisos bobos, quase infantis, quando me permito ver a vida brotando por entre a burocracia de adultos insones, cafeinados, comendo suas marmitas proteicas.

Os beija-flores voltaram a fazer seus ninhos. As crianças voltaram a jogar cartas e pular cordas.

Posso contemplar todo esse movimento quando sinto a presença enorme de mim mesmo.

Só, somente só. Ensimesmado de mim.

Quarenta minutos do segundo tempo. Agradeço a torcida.

Observo a grama verde.

Aqui e agora.

Só se vive uma vez.

 

Rafael Freitas